Compor cultura, na diferença
Thais de Bhanthumchinda Portela, Ariadne Moraes Silva, Maria Clara Matos Quintela, Mayara Almeida de Paula, Mônica Cristina Henriques Leite
As expressões sensíveis de cada sociedade são múltiplas e diversas. Segundo Jacques Ranciére essa diversidade do sensível foi partilhada, repartida em campos e depois em categorias como arte, arte popular ou erudita, arte popular tradicional ou de massa e assim por diante. Essas partilhas em especializações não são naturais, a seleção do que se enquadra como arte ou cultura é determinada por regimes de verdade administradas por ciclos político-econômicos que disputam, pautam e editam os sentidos dos campos e essas especialidades se isolam em seus próprios estamentos, com regimes discursivos próprios que impedem a troca, a criação comum entre categorias distintas. A crítica às especializações surgem cada vez mais com o exercício filosófico e prático das multi, inter e trans disciplinaridades e saberes. Como David Harvey que mostra como a racialização e discriminação de gênero são questões engendradas, e que perpassam toda a história do capitalismo, corroborando a disseminação do patriarcado como elemento estruturante das segregações sócio-espaciais. Como Carla Akotirene afirmando que tal estrutura é formada pela indissociabilidade do racismo, cis-hétero-patriarcado e capitalismo ou Dipesh Chakrabarty apontando para a relação da crise climática com a produção capitalística e o colonialismo, ou Gilles Lipovetsky demonstrando a relação da moda com o consumo e o capitalismo. Mas, por mais que o movimento de atravessar e integrar disciplinas e saberes seja discurso e demanda do contemporâneo, para efetivamente romper com o sistema de partilhas – não só do sensível mas também da vida divida em áreas como ambiental, social, econômico, o racial e/ou cultural – há que se construir metodologias, processos, procedimentos que lidem com os campos apartados, há que se criar práticas interseccionais amplas, que permitam que o heterogêneo se integre ao mesmo tempo que não se dilua em uma homegenização identitária hegemônica – que obriga as diferenças ao consenso dos ciclos de poder que pautam e dominam as insurgências das táticas alternativas, ou de resistência inerentes às coletividades emergentes ou as baseadas em epistemes outras. Buscamos com essa proposta engendrar um exercício tentativo de criação comum entre categorias partilhadas do campo da cultura, a saber: os relacionados às políticas de preservação do patrimônio, às ações de proteção da natureza, à criação da moda e aos diferentes modos de viver das lutas periféricas dos povos subalternizados. Como essas categorias do campo da cultura podem se integrar, com e na diferença, sem o consenso imposto pelo ciclo hegemônico do poder, que no momento aparenta ser o de extrema direita? Como trans-articular práticas comuns no heterogêneo? Como estar junto sem passar pela régua das administrações dos ciclos político-econômicos regidos razão hegemônica ocidental que partilha o sensível, dividindo e separando ações e viveres que deveriam estar integrados mesmo que na sua diferença? É esse exercício que este grupo propõe ao encontro.
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